Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo

Atua na defesa dos Institutos Públicos de Pesquisa Científica do Estado de São Paulo

Plantio comercial da macaúba é incentivado em São Paulo

Em uma área de Serra Negra (SP), município do Circuito das Águas Paulista, Luiz Henrique Chorfi Berton produz cerca de 200 mil mudas por mês de macaúba, vendidas para plantios em Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso do Sul e na região amazônica. 

No Estado de São Paulo, o fornecimento é feito apenas para iniciativas pontuais, em caráter experimental. O território paulista não tem áreas comerciais com o cultivo desta palmeira nativa da flora brasileira, que pode atingir 25 metros de altura e tem frutos ricos em óleo e proteína, com potencial para uso em indústrias de biocombustíveis e de alimentos. Mas, a depender dos esforços de empreendedores como Berton e pesquisadores, o cenário deve começar a mudar. 

Berton começou a estudar a macaúba no doutorado, no Instituto Agronômico de São Paulo (IAC), e continuou no pós-doutorado. Em 2018, teve um projeto aceito no programa de Pesquisa Inovativa da Pequena Empresa (PIPE) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Surgia a Acros, nome derivado de Acrocomia, gênero ao qual pertence a macaúba. 

Além de manter uma biofábrica, a empresa tem um braço educacional. Capacita pessoas a lidar com a produção das mudas, a entender a importância de usar substratos envoltos em papel 100% biodegradável, os paper pots, e apresenta possibilidades de consorciar a macaúba com outras culturas, como café, feijão, milho, girassol, e de usá-la para compor áreas de preservação permanente (APPs). 

O empreendedor também busca recursos para a construção de uma planta-piloto que extraia, do fruto da macaúba, óleo e farinha. O objetivo é treinar pessoas que queiram implantar uma usina de processamento em suas propriedades. 

Berton planeja fomentar o plantio comercial de macaúba a partir da região onde vive, e, aos poucos, expandir para outras áreas do estado. “Só aqui no Circuito das Águas, temos 180 mil hectares de terras prontas para cultivar macaúba. São áreas com baixa aptidão agrícola, pastagens degradadas, cafezais que podem receber plantio consorciado, entre outras”, afirma ao Agro Estadão. 

A aposta na macaúba é motivada por alguns fatores. Primeiro porque Luiz acredita que o cultivo da palmeira tem ainda muito a ganhar em produtividade. Segundo porque ela representa “uma oportunidade para o Brasil”. “Agrega, em uma única espécie, segurança alimentar, transição energética e combate às mudanças climáticas”, justifica.

Desenvolvimento de variedade
Durante a pós-graduação, Berton foi orientado pelo professor e pesquisador Carlos Colombo, que passou a olhar para as potencialidades da macaúba já em 2006, logo depois que o Governo Federal criou o Programa Nacional de Biodiesel. “Percebi, de cara, que a macaúba é uma planta fantástica. É a palmeira de maior ocorrência no continente americano e, no Brasil, está no centro da origem e da diversidade, já que sua ocorrência está em cinco biomas” explica o pesquisador.

Por serem bastante comuns, as árvores de macaúba encontradas na natureza oferecem uma ampla variabilidade genética. Para obter uma planta matriz que gere boas sementes e, consequentemente, mudas de qualidade, é necessário um rigoroso processo de seleção. Isso porque, diferente das culturas anuais, como milho e soja, a macaúba é perene e demora cinco anos ou mais para dar os primeiros frutos. Uma matriz ruim, segundo Colombo, pode comprometer todo o planejamento e a rentabilidade dos produtores. 

Com o interesse comercial pela planta em crescimento, as pesquisas têm se concentrado no desenvolvimento, em laboratório, das primeiras variedades – que reúnam as melhores características genéticas possíveis e, a partir delas, produzir clones. No próprio IAC, Colombo trabalha para colocar uma cultivar no mercado. Ele explica que essa é uma etapa importante porque os exemplares coletados nos ambientes naturais, por terem características muito heterogêneas, não possibilitam uma produção uniforme.  

Por outro lado, somente uma variedade não seria suficiente, já que não é recomendável um cultivo completamente homogêneo. “Nesse caso, pode acontecer o que a gente chama de depressão por endogamia. Sem variação genética, as plantas ficam vulneráveis. Se der uma doença, é muito grave, porque a macaúba é perene. Não se planta de novo no outro ano. O ideal para o produtor seria ter uma área com, pelo menos, uns 20 tipos de clones”.  

Colombo lembra que há uma rede de pesquisadores estudando a macaúba. Além do IAC, instituições como a Universidade Federal de Viçosa (UFV), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG, a Embrapa Agroenergia e a Embrapa Cerrados visam oferecer subsídios para a disseminação do cultivo e a implementação de usinas regionais. “É um negócio que tem despertado muito interesse”. 

Um dos fatores para isso é o futuro dos biocombustíveis. Atualmente, conforme dados coletados pelo professor, a demanda por óleo vegetal no mundo é da ordem de 220 milhões de toneladas anualmente, sendo que 87% vão para a indústria alimentícia. Até 2050, só para o setor de aviação, é projetada uma necessidade de 480 milhões de toneladas para a produção de combustível sustentável, o SAF. “Se a demanda for realmente essa, o volume não deverá vir do óleo de palma, o dendê, porque o plantio não tem mais para onde crescer. E nem da soja, que não deve entrar nesse mercado porque não tem rastreabilidade. Por isso, o futuro da macaúba é promissor”. 

Cooperação
Além de avançar nos estudos, o IAC desenvolve projetos de cooperação em prol das operações com macaúba, como uma parceria firmada em 2023 com a Acelen. A empresa do Grupo Mubadala, dos Emirados Árabes, comprou uma refinaria em São Francisco do Conde (BA). O plano da Acelen é plantar 180 mil hectares da palmeira para produção de biocombustíveis. 

O secretário de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, Guilherme Piai, afirma, em nota, que “a produção sustentável de biocombustíveis da macaúba está deixando de ser uma promessa e se tornando realidade, graças também ao competente trabalho de pesquisa desenvolvido por nossos institutos”. 

Outro órgão estatal que deve se engajar no fomento à macaúba é a Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), que, segundo o governo, pode facilitar o acesso a sementes e mudas. “O uso da sólida estrutura da CATI pode alavancar o estado de São Paulo como um polo nacional na produção de óleos vegetais com potencial de alto valor econômico e ambiental”, afirma a secretaria, em nota.  

Macaúba na ILPF
Na Agência Paulista de Tecnologia para os Agronegócios (Apta), regional de Pindamonhangaba, a macaúba também vem sendo estudada, mas com outra finalidade, inédita: a utilização da palmeira como elemento central em sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). 

A pesquisa, coordenada por Ricardo Dias Signoretti, busca aliar o plantio da espécie com produtos agrícolas anuais e com gramíneas forrageiras, com o intuito de promover diversificação produtiva e ampliar a sustentabilidade do sistema. 

Signoretti aponta que essa combinação busca o uso racional de recursos naturais e o aumento da rentabilidade dos produtores. “O sistema permite também a rotatividade das culturas, possibilitando a recuperação de áreas degradadas e uma maior preservação ambiental, atreladas aos ganhos de produtividade, tanto em culturas anuais, como no rebanho leiteiro e na macaúba”, declara, em nota. 

Ainda conforme o pesquisador, o estudo pode contribuir para transformar a dimensão socioeconômica regional, com geração de emprego e renda. “Podemos esperar o aumento da renda líquida e maior capitalização do produtor rural, possibilitando a fixação do homem no campo e melhor qualidade de vida”.

Fonte: Estadão / Foto: Acros

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