
Meses depois das graves denúncias feitas por pesquisadores e entidades científicas sobre o sucateamento da rede pública de ciência em São Paulo, pouco foi esclarecido sobre os rumos das pesquisas interrompidas e dos projetos ameaçados. O quadro de descaso do governo estadual continua sendo motivo de preocupação e de cobrança por parte da comunidade científica.
Em maio deste ano, a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC) expôs que atividades fundamentais no Centro de Engenharia e Automação do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) estavam sem condições de seguir adiante. “Linhas de pesquisa foram paralisadas por falta de pesquisador”, alertou a entidade à época, destacando que fazendas experimentais e áreas de apoio também sofriam com a drástica redução do quadro de servidores.
A gravidade da situação repercutiu em veículos especializados da área agrícola, que relataram a interrupção de estudos em grãos, hortaliças e fibras. Além disso, sindicatos e parlamentares denunciaram as propostas de venda de áreas pertencentes a institutos públicos, o que poderia agravar ainda mais a perda de infraestrutura científica.
A Academia Brasileira de Ciências também se manifestou, reforçando que medidas de desmonte comprometem a qualidade e até a sobrevivência da pesquisa. Em nota publicada em maio, a entidade foi categórica: “Mudanças que afetam a carreira dos pesquisadores e a estrutura dos institutos representam uma ameaça à continuidade de trabalhos estratégicos para o país.”
Quatro meses se passaram, e as incertezas permanecem. Não há informações públicas claras sobre a recomposição do quadro de servidores nem sobre a garantia de manutenção das áreas destinadas à pesquisa. Casos como o do IAC não são isolados — eles se repetem, em maior ou menor escala, em diversos institutos e centros de pesquisa, compondo um cenário de fragilidade que ameaça o futuro da ciência paulista.
A APqC reafirma sua posição crítica diante da negligência do governo estadual. “É urgente recompor os quadros de servidores, garantir financiamento adequado e impedir que a infraestrutura construída ao longo de décadas se perca”, cobra a entidade. Cada mês de indefinição significa mais riscos de retrocesso e de desperdício de conhecimento acumulado por gerações de pesquisadores.
Recentemente, a APqC entregou ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) uma carta aberta e um abaixo-assinado contra o Projeto de Lei Complementar 09/2025, que altera a carreira de pesquisador científico no Estado de São Paulo. O encontro ocorreu na Fazenda Santa Elisa, em Campinas, durante cerimônia oficial para entrega de equipamentos aos municípios. Na ocasião, o governador se reuniu brevemente com o pesquisador e ex-diretor do Instituto de Pesca, Luiz Marques da Silva Ayroza, que representou a categoria.
Na carta, a APqC solicita a retirada do projeto da Assembleia Legislativa (Alesp) para que a “proposta seja amplamente debatida com a comunidade científica e com a Comissão Permanente do Regime de Tempo Integral (CPRTI)”. O gesto reforça a mobilização dos pesquisadores contra medidas que, em vez de fortalecer a ciência paulista, ameaçam desestruturar ainda mais a carreira e comprometer o futuro dos institutos de pesquisa.