A notícia publicada pela Globo Rural sobre o estudo desenvolvido pelo governo paulista para uma possível venda de parte da fazenda Santa Elisa, que pertence ao IAC (Instituto Agronômico de Campinas), causou espanto no setor cafeeiro.
Pudera. O trabalho científico desenvolvido pelo IAC é uma das principais razões de a cafeicultura nacional ser tão produtiva e próspera.
O Brasil já era o maior exportador mundial de café quando o IAC foi criado, em 1887, por determinação do então imperador dom Pedro 2º –no início da República, em 1892, o órgão foi transferido para o governo paulista. Mas a manutenção do posto de potência agrícola se deve em grande parte ao trabalho de melhoramento genético desenvolvido pelo instituto a partir de 1932.
O IAC foi o responsável por lançar algumas das cultivares de café arábica mais plantadas atualmente no país, como catuaí e mundo novo. Isto porque o órgão desenvolve pesquisas de melhoramento a fim de criar cultivares mais produtivas e resistentes a pragas e doenças, como a ferrugem e o bicho mineiro.
É na fazenda Santa Elisa que está o maior banco de germoplasma de café do Brasil, e um dos mais valiosos do mundo. Há ali plantadas espécies de café raríssimas, quase inexistentes em outros lugares.
Desse banco surgem pesquisas que vão além da resistência a pragas, como um café que já sai do pé praticamente sem cafeína –no que deve ser o primeiro café descafeinado obtido por melhoramento genético do mundo.
A secretaria de Agricultura de SP disse que “toda e qualquer decisão tem como premissa garantir que as áreas de pesquisa em andamento sejam preservadas, modernizadas e valorizadas” e que “áreas que contêm pesquisa em andamento e bancos de germoplasma de culturas perenes, como o café, não serão alteradas”.
Há algumas décadas, porém, o órgão vive um esvaziamento. Faltam servidores e infraestrutura básica.
O abandono ocorre em momento em que o mundo luta para encontrar saídas para a agricultura em tempos de aquecimento global. O IAC, aliás, tem pesquisas para criar cultivares mais tolerantes ao calor e aos impactos das mudanças climáticas.
Talvez se o governo tratasse o órgão como ativo e não como um estorvo, o Brasil teria mais chances de se manter como potência agrícola pelos próximos séculos.
David Lucena, para a Folha de S. Paulo (Foto: Folha)