
Em meio a sucessivos cortes de recursos e à ausência de políticas de valorização da pesquisa pública, cientistas voltam a denunciar o desmonte das universidades e, sobretudo, dos institutos públicos de pesquisa em São Paulo. As instituições, responsáveis por avanços fundamentais em áreas como agricultura, meio ambiente e saúde, sofrem com a precarização estrutural e com a pressão crescente para atender às demandas do setor privado.
“O que se observa é uma tentativa constante de capturar as estruturas públicas e colocá-las a serviço de uma lógica mercantil”, afirma o professor Márcio Moretto, do Instituto de Estudos Avançados da USP. Segundo ele, “as universidades e institutos públicos de pesquisa, que vivem sob permanente ataque, são os únicos capazes de produzir conhecimentos e produtos que não atendam apenas aos interesses do capital privado. Mas, hoje, estão amplamente a serviço de um capital que busca cada vez mais se apropriar de suas estruturas e serviços”.
Os efeitos desse processo são sentidos de forma ainda mais dura nos institutos estaduais de pesquisa, que acumulam décadas de abandono por parte do governo paulista. Essas instituições, responsáveis por avanços fundamentais nas áreas de agricultura, meio ambiente, saúde pública e tecnologia, enfrentam dificuldades para manter equipes, laboratórios e projetos de longo prazo. A falta de concursos, a evasão de pesquisadores e a redução dos investimentos ameaçam a continuidade de pesquisas estratégicas para o desenvolvimento do Estado e do país.
Para Moretto, e outros docentes e pesquisadores presentes em evento realizado pela Adusp, a universidade pública também precisa ser repensada a partir de dentro. “Sem um projeto realmente ancorado na sociedade, ela perde apoio popular e fica à mercê de interesses corporativos”, avalia. O pesquisador defende que tanto universidades quanto institutos devem ampliar o diálogo com a sociedade, fortalecendo vínculos com a população e reafirmando seu compromisso com a produção de conhecimento público, acessível e socialmente orientado.
A crítica dos cientistas vai além da questão orçamentária. Eles denunciam que o governo do Estado tem aprofundado uma política de privatização disfarçada, estimulando parcerias e convênios que transferem recursos, equipamentos e resultados de pesquisa para empresas privadas. Trata-se de um processo silencioso, mas constante, que ameaça a autonomia da ciência pública e transforma o pesquisador em prestador de serviço para o mercado.
Para enfrentar esse cenário, os cientistas defendem maior mobilização social e resistência política, como vem fazendo a APqC, que há anos denuncia o sucateamento dos institutos de pesquisa e reivindica políticas públicas de valorização da ciência paulista. A entidade reforça que apenas com união entre pesquisadores, universidades e sociedade civil será possível garantir o caráter público da pesquisa e preservar a produção científica voltada ao bem comum.
Foto: Adusp / Radar Democrático