Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo

Atua na defesa dos Institutos Públicos de Pesquisa Científica do Estado de São Paulo

Audiência pública para venda de áreas de pesquisa é suspensa pela Justiça a pedido da APqC

São Paulo, abril de 2025 – A Justiça de São Paulo concedeu uma liminar e suspendeu, na tarde desta sexta-feira (11), a audiência pública convocada pelo Estado para a próxima segunda-feira (14), na qual pretendia discutir a venda de 35 áreas de pesquisa agropecuária. O pedido de suspensão partiu da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC).

A entidade argumenta que a Constituição do Estado exige que o Poder Legislativo seja consultado sobre eventual projeto de venda de áreas de pesquisa.

“Ao menos em sede preliminar, não consta que o Poder Legislativo tenha aprovado o pedido de alienação proposto pelo Poder Executivo”, anotou a juíza Glisa Elena Rios ao conceder a medida, que cabe recurso.

A convocação para a audiência pública ocorreu no último dia 8 de abril, por meio do Diário Oficial do Estado. Na publicação, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA) também apresenta, sem detalhes, uma lista de imóveis públicos utilizados para a pesquisa.

“Nenhum estudo foi apresentado pelo governo sobre os impactos de uma decisão radical como esta, tanto para o meio ambiente, já que estas fazendas abrigam remanescentes de mata nativa, e muito menos para a pesquisa científica”, afirma Helena Dutra Lutgens, presidente da entidade.

Entre as propriedades listadas pelo Estado está a Fazenda Experimental que fica na Estância Turística de São Roque e é referência em agroecologia. Nela foram desenvolvidas variedades de cebola e uvas orgânicas, melhoramentos da alcachofra, além do monitoramento da água para o cinturão verde de São Paulo.

Outra unidade na lista é a Fazenda Santa Elisa, que faz parte do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), onde são realizados estudos com a macaúba.

“No atual cenário de mudanças climáticas e da necessidade de descarbonização da economia, sobretudo do setor dos biocombustíveis, como SAF (combustível de aviação) e biodiesel, o IAC, assim como grandes grupos econômicos, vem trabalhando fortemente na construção da cadeia de produção de óleo vegetal a partir dessa palmeira chamada macaúba. São estudos que geram valor ao Estado, estimulam a economia e promovem sustentabilidade”, reforça Lutgens.

Segundo a APqC, as pesquisas com a palmeira estão concentradas na área que corre o risco de ser vendida, prejudicando a produção de conhecimento que pode levar a uma cultivar capaz de escalonar a produção de macatiba, hoje ainda na casa de dez mil hectares.

“O IAC, em parceria com a Apta Regional, está lançando nos próximos três anos a primeira cultivar brasileira de macatiba para plantio em escala, algo que só é possível graças às pesquisas realizadas nestas fazendas, e o estudo para que isso aconteça está concentrado justamente na área que o Estado quer vender”, destaca a presidente da APqC.

A mesma área na Santa Elisa também abriga parte do maior banco de germoplasma de café do Brasil e um dos maiores do mundo.

Liminar
Na decisão, a juíza também pontua que “falta clareza quanto a identificação das áreas afetadas, isto é, se a alienação será total ou parcial; como foi realizado o cálculo para fixar o preço de venda; como será a preservação de toda produção científica dos institutos afetados; qual estudo econômico realizado que ensejou a alienação e se as áreas envolvidas estão sob regime de proteção permanente”.

A liminar também cita o local escolhido pela SAA para realizar a audiência, que teria capacidade para abrigar 150 pessoas, “enquanto a comunidade científica é composta por mais de 600 membros, que teriam sido convocados para participarem da audiência pública”.

A justiça determina ainda que, na contestação, o Estado apresente autorização do Legislativo para a venda, além de “especificar as áreas afetadas com a metragem, mapas e respectivas divisas; se a alienação será total ou parcial; como foi realizado o cálculo para fixar preço de venda; como será a preservação de toda a produção científica dos institutos afetados; qual estudo econômico realizado que ensejou a alienação e se as áreas envolvidas estão sob regime de proteção permanente”.

Leia a Liminar:
Liminar deferida_audiencia-publica

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Liminar deferida

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
COMARCA DE SÃO PAULO
FORO CENTRAL – FAZENDA PÚBLICA/ACIDENTES
15ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA
Viaduto Dona Paulina, 80, 14º Andar, Centro – CEP 01501-020, Fone: 3242-2333, São Paulo-SP – E-mail: sp15faz@tjsp.jus.br
Horário de Atendimento ao Público: das 13h00min às 17h00min

DECISÃO

Processo Digital n°: 1030671-53.2025.8.26.0053
Classe – Assunto: Ação Civil Pública – Servidores Ativos
Requerente: Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo – Apqc
Requerido: Fazenda Pública do Estado de São Paulo

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Glisa Elena Rios

Vistos.

Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada por Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo – Apqc contra Fazenda Pública do Estado de São Paulo, na qual requer a concessão de medida liminar para que seja suspensa audiência pública a ser realizada em 14 de abril de 2025, às 10h, no Salão Nobre da Secretaria de Agricultura e Abastecimento. Subsidiariamente, caso não seja suspensa a audiência pública, requer que seja compelida a parte Ré a informar a quantidade de servidores convocados, a lista de presença, bem como a capacidade física do auditório.

É o relatório. Decido.

Verifica-se a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora para a concessão da medida liminar.

Na hipótese dos autos, o Secretário de Agricultura e Abastecimento, por comunicado de 8 de abril de 2025, convocou “toda a comunidade científica da APTA – Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios e em especial os dos Institutos de Zootecnia, Biológico, Pesca, Agronômico e da APTA – Regional, para participarem de audiência pública que será realizada no dia 14 de abril de 2025, às 10h, no Salão Nobre da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, localizado na Praça Ramos de Azevedo, 254 – 1º andar – Centro da Cidade de São Paulo, para tratar da alienação por parte do Governo do Estado das áreas, ou parte delas.

As áreas a serem alienadas são áreas ou partes de áreas dos Institutos de Pesquisa, localizadas segundo a convocação em: “São Roque (SGI 3915), Iguape (SGI 3041), Peruíbe (SGI 3232), Campinas (SGI 67696), Nova Odessa (SGI 3223), Nova Odessa (SGI 3222), Nova Odessa (SGI 3227), Nova Odessa (SGI 3229), Nova Odessa (SGI 3228), Nova Odessa (SGI 3604), Nova Odessa (SGI 2929), Mococa (SGI 3955), Monte Alegre do Sul (SGI 3972), Piracicaba (SGI 3962), Ribeirão Preto (SGI 3968), Tietê (SGI 3963), Sertãozinho (SGI 2926), Campinas (SGI 3202), Ribeirão Preto (SGI 3970), Jai (SGI 3956), Ubatuba (SGI 3914), Gália (SGI 3957), Itararé (SGI 3844), Palmital (SGI 62668), Dois Córregos (SGI 3242), Registro (SGI 3239), Cananéia (SGI 3233), Cananéia (SGI 3234), Pirassununga (SGI 3971), Campinas (SGI 3217), Jundiaí (SGI 3213), Itapetininga (SGI 3845), Pindamonhangaba (SGI 3913), Tatuí (SGI 3843) e Nova Odessa (SGI 2927).

Para a alienação de área de institutos e centros de pesquisa, o artigo 272 da Constituição Estadual de São Paulo estabelece:

Artigo 272 – O patrimônio físico, cultural e científico dos museus, institutos e centros de pesquisa da administração direta, indireta e fundacional são inalienáveis e intransferíveis, sem audiência da comunidade científica e aprovação prévia do Poder Legislativo.

Ao menos em sede preliminar, não consta que o Poder Legislativo tenha aprovado o pedido de alienação proposto pelo Poder Executivo.

Ainda que exista a Lei Estadual n. 16.338/2016 autorizando a alienação sem a necessidade de aprovação da Assembleia Legislativa Estadual, é passível de questionamento sua constitucionalidade, eis que a alteração da Constituição Estadual deve ser realizada por emenda constitucional e não por lei.

Além de indício da presença de vício de iniciativa, falta clareza quanto a identificação das áreas afetadas, isto é, se a alienação será total ou parcial; como foi realizado o cálculo para fixar o preço de venda; como será a preservação de toda produção científica dos institutos afetados; qual estudo econômico realizado que ensejou a alienação e se as áreas envolvidas estão sob regime de proteção permanente.

Também é passível de questionamento o local em que será realizada a audiência pública, eis que o Salão Nobre da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, localizado na Praça Ramos de Azevedo, 254 – 1º andar – Centro da Cidade de São Paulo, não teria capacidade para acomodar toda a comunidade científica do Estado de São Paulo, pois contaria com 150 lugares, enquanto que a comunidade científica é composta por mais de 600 membros, que teriam sido convocados para participarem da audiência pública.

Todos os apontamentos acima declinados evidenciam a presença do fumus boni iuris.

O perigo da demora é evidente, eis que a audiência pública está agendada para o dia 14.04.2025.

Presente os requisitos legais, DEFIRO A LIMINAR para suspender a realização da audiência pública designada para o dia 14.04.2025 às 10:00hs no Salão Nobre da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, até o julgamento final da presente ação.

A presente decisão tem efeitos de ofício e poderá ser encaminhada pelo próprio interessado ao órgão ou autoridade competente, acompanhada das cópias que se fizerem necessárias, reconhecida a autenticidade pelo próprio advogado, nos termos do art. 197 e 425, IV, CPC.

Na contestação, a Fazenda do Estado deverá indicar de modo pormenorizado se houve autorização prévia do Poder Legislativo, especificar as áreas afetadas com metragem, mapas e respectivas divisas; se a alienação será total ou parcial; como foi realizado o cálculo para fixar o preço de venda; como será a preservação de toda produção científica dos institutos afetados; qual estudo econômico realizado que ensejou a alienação e se as áreas envolvidas estão sob regime de proteção permanente.

Sem prejuízo, ao Ministério Público.

Intime-se.

São Paulo, 11 de abril de 2025.

GILSA ELENA RIOS
Juíza de Direito

DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006, CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por GILSA ELENA RIOS, liberado nos autos em 11/04/2025 às 13:58.
Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/pg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 10:00671-53.2025.8.26.0053 e código Sòng.Zobo.

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